Rico de papel...quase

No início da minha carreira tinha um cliente que administrava diversas empresas de mineração. Fiz muito trabalho para esse cliente, que me consta há um bom tempo falecido, cuja postura e voz retumbante eram impressionantes. Nas suas próprias palavras seria um homem "de gabarito", expressão que gostava de usar para descrever suas reuniões. Vejam só, um belo dia descobri que a sua empresa estava lançando ações na bolsa de Vancouver, no Canadá.

Eram outros tempos. Não existia Internet, e informações, principalmente as informações quentes, eram difíceis de descobrir. Quem as tinha não compartilhava com facilidade. Hoje em dia você pode ler tratados médicos e jurídicos online. Isso não faz de você um médico nem tampouco jurista, e é possível que não entenda nada, mas pelo menos você tem acesso às informações. Portanto, não era tanto ingenuidade, acho que era falta de informação mesmo. Muitas vezes dava-se grandes chutes fora e o aprendizado era dolorido.

Este cliente insista comigo que se soubesse de algum investidor, que me pagaria um "finder´s fee", ou seja, uma comissão sobre qualquer valor investido. Nada mais justo - e legal, também. Falava-se em investimentos em milhões de doletas nas Gerais.

Um belo dia, conversando com uma outra cliente que também trabalhava na área, esta mencionou ter um amigo com muito dinheiro para investir.

Marcou-se uma reunião "de gabarito". Falou-se muita coisa, foram mostradas fotos, muitas fotos. Meu cliente só mencionava os alvarás de lavra do DNPM, disponíveis em profusão, das vastas quantidades de ouro embaixo do solo, e de muito potencial, enquanto o "investidor" insistia em saber da capacidade operacional atual do grupo de empresas. Obviamente, havia um impasse. No final da reunião meu cliente  me pegou de lado, e com ares conspiratórios corroborou que eu teria uma grande comissão - em ações da empresa!!!

Quem diria, eu um rico proprietário de ações de uma grande empresa de mineração.

A reunião não deu em nada. Ainda bem. Logo depois descobri que o grupo de empresas do meu cliente na realidade eram empresas de grupo, e que na época a Bolsa de Vancouver era conhecida pelo grande número de empresas de mineração fictícias ou de papel - na qual se enquadrava meu cliente.

Ou seja, quase caio num verdadeiro golpe e levo alguém comigo na maior inocência, sem saber. Se tivesse dado certo, o impressionante cliente do vozeirão teria desaparecido com a dinheirama do "investidor", que, diga-se de passagem, não parecia ter dinheiro, e eu teria ficado com um monte de papel que não valia absolutamente nada. Isso se não tivesse seguido o caminho do cemitério, cortesia do ludibriado financista. Grande livramento.

Em suma, aprendi na marra o que vem a ser a expressão "due dilligence".

Uma lição que deveria ser aprendida pela rapeize da Wall Street.

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