Quem inventou as Monomarcas?

Conheço algumas pessoas que se conhecessem o inventor dos torneios monomarca, certamente daria uns sopapos no pobre coitado. Não sei qual foi a primeira corrida (ou torneio) monomarca realizado intencionalmente até hoje. Digo intencionalmente por que, aqui e ali, pode ter ocorrido alguma corridinha nos anos 20 e 30 só com Bugattis, mas isso não teria sido intencional. Entretanto, a corrida narrada neste post, se não foi a primeira, provavelmente foi uma das primeiras tentativas de realizar um campeonato e corrida monomarca no mundo.

O local e a época não poderiam ser mais esdrúxulos. Hoje já estamos nos acostumando com corridas na Indonésia, Malásia, China, e até a Índia entrou no circuito dos GPs. Mas no periodo logo após a Segunda Guerra Mundial, realizar corridas em locais que não fosse o oeste da Europa ou os EUA pareceria loucura. Que tal África?

Não que não ocorressem corridas no continente. Um dos mais famosos GPs dos anos 30 foi o de Trípoli, na Líbia, e até mesmo a África do Sul teve o prazer de ser visitada pela Equipe Auto Union. Mas Egito?

O visionário tem dois destinos – ou ele se torna um sucesso estrepitoso, ou um fracasso ímpar. Não é preciso dizer que idealizador desta corrida monomarca, em pleno 1947, acabou no segundo time.

Piero Dusio era o nome do cara, e o carro, sua criação, o Cisitalia. Imagino, com alguma liberdade poética, que Piero achava que um torneio monomarca com o seu rebento, o D46, salvaria o automobilismo mundial. E com o suporte financeiro de alguns suiços, embarcou nessa louca aventura. sempre os helvéticos...

Dezesseis D46 foram enviados ao circuito de El Ghezira, numa ilha residencial de Cairo. Os pilotos, quase todos italianos, incluiam Alberto Ascari, Franco Cortese, Piero Taruffi, Nello Pagani, Dorino Serafini, entre os mais conhecidos. O próprio Dusio também pilotaria um dos carros. Além de Louis Chiron, o monegasco que já havia ganho diversos GPs no pré-guerra.

Os pilotos se divertiram à beça. As autoridades, locais, inclusive o Rei Farouk, abraçaram a iniciativa com gosto. Entretanto, no dia da corrida, somente 6000 almas assustadas presenciaram a corrida de duas baterias e uma final.

Cortese ganhou uma das baterias, e Ascari a outra. Na final de 50 voltas, deu Cortese novamente, seguido de Ascari, Taruffi, Dusio e Tadini. Cortese recebeu o trofeu feito de ouro puro das mãos do Rei, só que os suiços não ficaram nada impressionados com o fracasso financeiro do criativo evento, deixando Dusio na mão. De fato, quase quebrado.

Os D46 foram vendidos para pilotos de diversos países, e pilotados por muita gente famosa, inclusive Nuvolari e Stuck, ganhando corridas em diversos lugares. Equipado com motor Fiat de 1500 cc, foi usado na classe voiturette, chegando a disputar provas até a década de 50.

A Cisitalia nunca foi para frente, sem dúvida por causa do fracasso – temporário – da ideia monomarca. Mas os carros produzidos pela empresa são apreciados até hoje.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo baseado em Miami

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