Questões financeiras


Uma coisa é certa. Todos concordam que o automobilismo é um esporte caro, e sempre foi. Hoje é absurdamente caro, a única diferença. O humilde chão de um carro de F-1 custa 25.000 libras esterlinas. Compare isto com 40.000 libras, o custo de uma temporada inteira de F-3 na Inglaterra por volta de 1978 e 5.000 libras, o custo de um motor Cosworth de F1 lá por volta de 1975! É bem verdade que uns quatro, cinco anos depois, uma temporada de F3 britânica se inflacionava, atingindo mais de 120.000 libras, ainda uma barganha comparada com o custo atual. O mundo era bem menos rico, também, não havia tanto dinheiro em circulação.

Além de custos menores, havia uma certa informalidade, mesmo no desenvolvido automobilismo europeu, que é de assustar. Na corrida de inauguração de F2 em Paul Ricard, em 1970, os pilotos desconfiaram que iriam levar o chapéu dos organizadores, e fizeram uma pequena greve. Os últimos não titubearam. Mandaram os pilotos passarem no caixa de um banco existente nas dependência do novo autódromo, e ali todos receberam o valor dos seus prêmios, adiantado, em dinheiro!

Pelo menos no caso acima, o financiador era um banco mesmo. Mais peculiar é um caso dos anos 50.

A Maserati e seu modelo 250 F foram exclusivamente responsáveis pela saúde numérica dos grids da grande maioria das corridas de F1 e Formula Libre da segunda metade da década. Embora o fabricante tivesse uma equipe de fábrica, que contava com alguns dos melhores pilotos da época, eram os diversos independentes que corriam com 250F que faziam a diferença quantitativa. Muitos independentes eram italianos, mas pilotos de diversas nacionalidades correram com produtos da fábrica nessa época - pilotos da Inglaterra, Suécia, Austrália, Estados Unidos, Argentina, França e mesmo do nosso Brasil varonil.

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O final da segunda guerra tinha ocorrido há pouco tempo, e a Europa ainda se reconstruía. A Inglaterra impunha severos controles cambiais aos seus cidadãos - nada de práticos caixas automáticos, lembrem-se. Assim, os ingleses que se aventuravam a correr no continente, frequentemente saíam no começo do ano e só voltavam no final ao seu país. Ficavam a perambular na Europa, vivendo em um ônibus com seu fiel mecânico (geralmente um) e pagando as despesas com o dinheiro ganho na última corrida.

A maior despesa no curso da temporada era a revisão dos motores na própria Maserati, que entre outras coisas, exigia frequentes viagens para Modena. Uma vez na cidade, os menos afortunados pilotos ficavam hospedados num hotel, para não levar a Maserati a duvidar da periclitante situação financeira do seu cliente.

Não era um Four Seasons, mas sim um simples albergho, ainda assim muito caro para um bom número de pilotos. A proprietária, entretanto, agia como um banco particular para os pilotos mais pobres. Volantes de fábrica, como Jean Behra, também ficavam hospedados no hotel, e com frequência confiavam à dona vultosas quantias em dinheiro para guardar, pois não podiam recorrer aos bancos. Pilotos duros e clientes da Maserati como Horace Gould e Bruce Halford não só penduravam contas no hotel, como tomavam grana emprestada da empreendedora proprietária. O dinheiro provavelmente era a captação feita com os pilotos mais ricos! Ou seja, a hoteleira era um banco dos pilotos no continente.

No fim da temporada, fechava sua contabilidade com os pilotos, e não há registro de que tenha tomado calote de ninguém.

Outros tempos.

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