PODIA TER DADO TUDO MUITO ERRADO


Já escrevi extensivamente sobre os diversos torneios de automobilismo realizados entre 1970 e 1972 no Brasil, que culminaram na inclusão do GP do Brasil no calendário a partir de 1973 - diga-se de passagem, um dos únicos GPs realizados sem uma única interrupção desde então. De cabeça, só conto os GPs de Monaco, Alemanha, Inglaterra e Itália. Tenho minhas dúvidas sobre o GP da Bélgica, estou com preguiça de procurar, mas acho que deixou de ser realizado em alguns anos.

Porém, tudo podia ter dado muito errado.

Vejamos o porimeiro destes torneios, o de Formula Ford em 1970. O maior otimismo foi incluir quatro pistas no torneio, justamente os quatro "autódromos" existentes no Brasil na época - Rio, Curitiba, Fortaleza e Interlagos. Destes, só São Paulo tinha reais condições de realizar corridas internacionais.

No Rio, na primeira prova, o povo quis invadir a pista, e por pouco não ocorre uma desgraça de grandes proporções. Já em Curitiba, a polícia foi mais rigorosa, porém, a pista não era própria para FF, de fato, nem existia o misto e o autódromo era bastante primário. No caminho de Fortaleza, as carretas que transportavam os carros quebraram no meio do caminho, e a corrida por pouco não é realizada. Os carros chegaram às 5 da manhã do domingo. Depois os carros voltaram ao Rio, para a apoteose em Sampa.

A apoteose foi o ponto alto do torneio, e deixou boa impressão. Porém, ficou claro que marcar uma corrida em Curitiba, seguida de outra em Fortaleza, foi um exercício de otimismo ou estupidez, principalmente nas estradas brasileiras dos anos 60 (era 1970, lembrem-se). Mesmo a inclusão de pseudo-autódromos parecia ser queimação de filme, e daí para frente, Interlagos, de durante um curto tempo, Tarumã, ainda não inaugurado, passaram a receber todas as corridas de torneios internacionais.

Fico pensando também na estrutrura hoteleira de Curitiba e Fortaleza na época. Sou paulista e morava em São Paulo, e pelo que me lembre, até mesmo a minha cidade era bastante precária nesse quesito.

O que salvou um pouco a coisa é que este tipo de improvisação não era incomum em 1970. Já escrevi sobre o GP de Israel daquele ano, das improvisadas corridas em Tulln Langellebarn e mesmo de uma prova de Formula 2 em Paul Ricard na qual os pilotos quase fazem greve, por querer o dinheiro prometido adiantado. Sem querer corridas na Dinamarca, Suécia, Portugal e Finlândia com ângulos super engraçados. O automobilismo ainda era, de modo geral, muito desorganizado.

Obviamente, ninguém transportava carros a 5000 km de distância para não ser pago ou sofrer acidentes em estradas de péssima qualidade. Assim que o Brasil, por ser o longínquo Brasil, e pela desonfiança que ainda gerava, tinha que seguir um padrão mais rigoroso do que os austríacos de Tulln e os franceses de Ricard, pagar adiantado e dar mais "garantias".

No final, tudo deu certo e o nosso Brasil pode se orgulhar de ter seu próprio GP há quase quarenta anos seguidos.

Carlos de Paula é escritor, tradutor e historiador de automobilismo baseado em Miami

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RESULTADOS DE CORRIDAS BRASILEIRAS REMOVIDOS DO BLOG

O taxista de São Paulo, e muito disse não disse

DO CÉU AO INFERNO EM DUAS SEMANAS - A STOCK-CAR EM 1979