Suicídios no automobilismo


Desculpem pelo tópico mórbido. Mas quando vem um assunto à mente, a gente tem que escrever. Principalmente quando há falta de assunto.

Na atualidade, pouco se associa a palavra suicídio ao automobilismo. Antigamente, uma parcela muito grande da população que não entendia o automobilismo associava a prática do esporte ao suicídio. Correr de carros era, na ótica de muitos, nutrir um desejo de morrer pelos seus próprios meios. Como havia muita morte no esporte, o conceito maluco pegou. Hoje em dia relativamente poucos morrem, e ninguém mais fala no assunto.

Na realidade, a incidência de suicídios entre automobilistas é pequena. Com certeza, muito inferior a artistas plásticos, músicos, empresários de grande porte e intelectuais.

De fato, de cabeça, só me lembro de dois.

Um deles envolveu um ex-piloto de Fórmula 1, o belga Willy Mairesse. E ainda por cima, ex-piloto da Ferrari. É certo que Willy nunca foi do time A, pois a Ferrari tinha um time A e um time B de pilotos na época. Os primeiros geralmente faziam a temporada inteira de F1, e corriam nos melhores carros esporte da fábrica. Os pilotos do segundo time esporadicamente corriam na F1, principalmente em provas não válidas para o campeonato, e ocupavam os carros esportes e protótipos de segunda linha da equipe de Maranello.

Mairesse era rápido, mas um pouco desastrado. Bastante desastrado. De fato, era do tipo Vittorio Brambilla. Tinha uma forte rivalidade com outro belga, Olivier Gendebien, que obteve muito mais sucesso do que ele. No começo da sua carreira, em 1957, Mairesse teve diversos acidentes com carros potentes. Willy ganhou a Tour de France duas vezes, além de rallyes. Na F1, Willy pilotou para a Ferrari pela primeira vez em 1960, e obteve o terceiro lugar no GP da Itália. Sem desdenhar do feito, a última corrida foi boicotada pelos pilotos ingleses, que já compunham a maioria dos pilotos competitivos da F1.

Em 1961, Mairesse pouco participou da equipe que ganhou quase tudo na F1. Só correu no GP da Alemanha com o Sharknose, no qual se acidentou.

Em 1962, Mairesse ganhou a Targa Florio, além dos GPs de Napoles e Bruxelas. Em SPA, no GP do seu país, teve um acidente terrível com Trevor Taylor. Sofreu queimaduras, e ficou de molho até o GP da Itátia, onde obteve o quarto lugar.

Terminou sua participação como piloto de F1 da Ferrari com um acidente, novamente na Alemanha. Tentou largar no GP belga de 1965 com uma BRM da equipe Centro-Sud, sem sucesso.

Sua última corrida foi em Le Mans, em 1968. Corria com um Ford GT 40, cuja porta abriu durante a corrida, levando Willy ao seu último acidente. Teve ferimentos graves na cabeça, e ficou inconsciente durante duas semanas. Quando caiu a ficha de que a sua carreira tinha acabado, Willy tomou uma overdose de pílulas para dormir, e morreu ingloriamente num quarto de hotel em Ostende, litoral da Bélgica, em 1969.

O suicídio do segundo personagem me chocou muito. Voltava de férias do Brasil, e fiquei abismado com a manchete do jornal semanário Auto Week, Peter Gregg cometeu suicídio.
Gregg, conhecido como Peter Perfect, não é muito conhecido dos brasileiros. Os mais chegados ao Mundial de Marcas o reconhecerão como vencedor das 24 Horas de Daytona de 1973, e como ávido participante de Le Mans e outras corridas de longa distância. Também correu na Can-Am em 1973. Quase sempre com Porsche, Gregg era o bicho papão da série IMSA Camel. Alguns lugares dizem que venceu quase a metade das corridas em que participou, 152 vitórias, mas acho isso exagerado. Na IMSA Camel, Gregg obteve 53 vitórias, inclusive uma com BMW em 1976.

Além de ser um corredor de primeira, Gregg também tinha uma revendedora Porsche-Audi e Mercedes em Jacksonville, Florida. Deu um tiro na própria cabeça, em 15 de dezembro de 1980, na estrada A1A, que beira a costa do leste da Flórida.

A história que circulou na época é que Gregg chegara a conclusão de que já não era muito rápido, e por isso se matou, não podia mais ser perfeito. Na nota de suicídio, Gregg dizia que tinha uma doença progressiva e incurável do sistema nervoso, e que não desejava viver sem plena capacidade física. Há também uma versão de que sofreu um acidente a caminho das 24 Horas de Le Mans daquele ano, e por causa do acidente, começou a ter um problema de visão permanente. Isso o teria levado a uma depressão que o levou ao ato supremo. Outros lugares dizem que era maníaco depressivo.

Sabe-se lá qual é a verdade, mas o fato é que Gregg se matou, seja qual for o motivo.
Sua esposa, Deborah, continuou a tocar não só a concessionária, como a equipe Brumos, e obteve razoável sucesso na Trans Am.

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