Por que o GP de Austin provavelmente não dará certo

Muitos têm acompanhado a saga do GP de Austin no Brasil, porém, poucos têm o privilégio qualificado de segui-la do ponto de vista americano como eu. Vejam bem, quando cheguei nos EUA, o país tinha dois GPs de F1, um em Watkins Glen e outro em Long Beach. Desde então, foram realizados GPs em Detroit, Dallas, Las Vegas, Phoenix e Indianapolis, além dos dois outros locais citados. Apesar da importância da economia americana, o GP deste país não firma.

Havia muita expectativa em volta do GP em Austin, porém, me parece que as coisas estão começando de modo errado.

Há alguns meses atrás, quando havia grandes dúvidas quanto à realização da corrida, foram postos alguns ingressos à venda, a US$150.00. Um preço alto para um evento de realização questionável, porém, trata-se de um GP da F1, afinal de contas.

No site oficial do GP, os ingressos baratos já se esgotaram! Grande sucesso (será?). O mais barato agora é um ingresso de US$500.00. Ingressos mais baratos ainda podem ser achados em miríades de sites de cambistas, uma atividade supostamente ilegal nos Estados Unidos, porém, que não só prospera, como prolifera. Acha-se ingressos por US$350.00, que julgo, sejam os ingressos de 150 paus que foram comprados às pencas pelos cambistas.

Quem sou eu para ensinar o Padre Nosso ao vigário. Porém cobrar uma fortuna por ingressos por um evento que no começo da temporada parecia que não sairia do papel, de um esporte que está tentando mais uma vez se firmar nos Estados Unidos, me parece ser equivalente a tentar ganhar um GP na primeira volta, a la Romain Grosjean.

Sim, o investimento na pista foi alto, e os investidores querem ver a cor do dinheiro JÁ. Entretanto, a visão tem que ser pelo menos de médio prazo para o investimento dar certo. No mesmo dia em que está sendo realizado o GP americano, está sendo realizada a final da NASCAR em Homestead. Detalhe, um ingresso para essa corrida pode ser obtido por 100 dólares ou menos, e é um esporte popular nos EUA. De fato, aqui é o sinônimo de corrida de carros, de automobilismo de competição. E Miami é um lugar muito mais interessante do que downtown Austin, convenhamos.

A 500 dólares, e com os preços caros de passagem na semana que antecede o Thanksgiving, uma excursão a Austin, para ver os carros passando na sua frente algumas dezenas de voltas, certamente custaria uns 3000 dólares. Já o equivalente NASCARIANO provavelmente custaria uns 600 a 1000 dólares, dependendo do seu ponto de origem dos EUA.

Mas a F1 é a F1. Infelizmente, para o americano não é! Sim, na F1 o autódromo fica cheio de gente bonita, e não de rednecks sem dentes ou gordonas americanas tomando litros de cerveja e gritando que nem loucas, cena típica das corridas de NASCAR. A maioria dos leitores deste blog sabe muito bem como funcionam as coisas num GP. A maioria, se não toda "gente bonita" num GP não pagou um centavo para entrar!!! São convidados de patrocinadores, e provavelmente nem gostem da F1. Estão ali por causa do auê, e se tiverem que tirar um centavo do bolso para ir a um GP, ficam em casa. A mesma coisa as dúzias de celebridades, que enchem os camarotes com caras e bocas, ou pior ainda, permeiam o grid poucos minutos antes da largada, ávidos por aparecer na TV para centenas de milhões de pessoas mundo afora.

Sim, sob o ponto de vista berniano, uma corrida de F1 não é um evento automobilístico para amantes do automobilismo, mas sim, um evento de marketing de massa. Para o promoter, entretanto, encher as arquibancadas, e não aumentar a porcentagem de audiência na TV, é o objetivo principal. Infelizmente, ingressos a 500 paus, no mesmo dia da final da NASCAR não é a forma mais inteligente de encher as arquibancadas de um GP americano.

É certo que existe um número razoável de bobos no mundo, que querem se imiscuir entre as modeletes da hora e seus lindos e marombados acompanhantes, que gostam de estar no meio de gente bonita e jovem, apesar de velhos e feios, e não se incomodam em pagar 500 paus para tanto. Não se importam que as arquibancadas parecem-se com os voos da falida Pan-Am, que tinham mais gente voando de graça do que pagando na sua fase final.

A meu ver, a precificação foi errada. Pode ser que, sendo no Texas, a coisa ande por algum tempo. A sociedade texana é muito antenada com eventos de sociedade, principalmente quando podem mostrar que têm dinheiro. E a economia do estado é a única a ir bem no país, muito obrigado, graças ao petróleo. Resta saber se depois de 3, 4 anos, o pessoal não se cansa de mais este evento caro - ainda por cima barulhento, e sem dividendos políticos ou empresariais.

Carlos de Paula é tradutor e historiador do automobilismo baseado em Miami 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O taxista de São Paulo, e muito disse não disse

RESULTADOS DE CORRIDAS BRASILEIRAS REMOVIDOS DO BLOG

DO CÉU AO INFERNO EM DUAS SEMANAS - A STOCK-CAR EM 1979