O fator Galo

Depois de passar a maior parte da manhã matutando sobre a óbvia manipulação dos candidatos presidenciais americanos no debate de ontem, decidi escrever este humilde post, que aliás, já estava na minha mente ontem.

Chegou ao fim a longa novela Felipe Massa - Ferrari, e pela décima quarta temporada seguida, teremos um brasileiro na mais tradicional equipe de F-1. Porém, não no poleiro!

Segundo Luca di Montezemolo, o chefão da Ferrari, a equipe não comporta dois galos, somente um. Ou seja, um galo, quem sabe uma galinha e um pinto, um frango, para ser mais polido. Com isso, Luca disse, de modo claro, que não considera Felipe um piloto do mesmo nível que Fernando. Não é um galo.

Um monte de gente já escreveu o óbvio, "mais uma vez um brasileiro subserviente na Ferrari, blá blá bla", mencionando os tempos de Rubinho também. Seletivamente esquecem-se dos 1000 Km de Nurburging de 1973, ou mais longe ainda, do início dos anos 50, quando "Seo" Chico ficou relegado a uma posição secundária na Scuderia, enquanto pilotos italianos e argentinos disputavam o Mundial de Pilotos com os carros da marca.

A grande pergunta ninguém faz, e é, por que não temos mais galos?

Estive fazendo uma análise, e acho que cheguei a uma conclusão. Ao contrário do que muitos pensam, o piloto mais bem sucedido da F1, Michael Schumacher, não veio de uma família rica. Nem tampouco Kimi Raikkonen. De fato, nem Lewis Hamilton, e que eu saiba, nem Fernando Alonso, nem Jenson Button, nem Sebastian Vettel. Foram pilotos em quem alguém apostou desde muito cedo, na época do kart, e isso significa, bancar a carreira, com base em mérito ou potencial. Cartas marcadas desde cedo.

Quanto aos nossos conterrâneos, analisemos. Dois dos últimos a atingirem a F1, Bruno Senna e Nelson Angelo Piquet, embora talentosos, em grande parte interessaram a patrocinadores pelo seu potencial de marketing, sobrenomes de ex-campeões do mundo - algo que, diga-se de passagem, também favoreceu os ex-campeões Jacques Villeneuve e Damon Hill.  Todos sabemos a história de Nelson Angelo, e francamente, não acho que Bruno seja candidato a galo.

Ocorre que há um certo tempo, muitos dos nossos pilotos que atingem o nível de GP2 (e anteriormente F3000) são membros de famílias extremamente abastadas, para não dizer riquíssimas, que frequentemente empacam na categoria inferior ou mesmo na F3. Não vou mencionar nomes. São vistos com certa suspeita pelo establishment da F1, que os consideram uma versão atual de PPD, e não galos.

Infelizmente, o "pipeline" de jovens pilotos talentosos, identificados desde a época do kart, é baseado na Europa, o que explica a ausência de pilotos de outros continentes nos níveis mais altos da categoria. O cara tem que ser O CARA, como o mexicano Sergio Perez, para aspirar à galitude. E há muito tempo que não temos UM CARA.

Teria eu soluções? Francamente, não tenho, só identifiquei o problema.

Pode ser que algum dia brasileiros possam voltar a aspirar a um lugar mais proeminente na granja, o poleiro. Até lá, terão que ciscar no chão.

Carlos de Paula é tradutor e historiador de automobilismo baseado em Miami


  
 

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