Projetos-fantasma na Formula 1

É muito fácil tirar onda com as equipes mais mal sucedidas da F1, como Life, Hispania, Andrea-Moda, Forti, Euro-Brun, Lyncar, Amon, Maki, Merzario...Entretanto, cabe-lhes mérito, pois, querendo ou não, um número imenso de “projetos” nunca  chegaram a participar de um GP.

Já escrevi inclusive sobre alguns destes projetos. Por exemplo, o Berta F-1, que supostamente disputaria a temporada de 1975 com Garcia Veiga. Nesse ponto os platinos perderam a corrida para os rivais brasileiros, pois o Berta nunca disputou a F-1, embora tenha achado lar na F-5000 americana. A iniciativa não foi bem sucedida mesmo na F5000, algo que Oreste Berta não estava acostumado.

Depois houve o projeto português Marinho,  planejado, senão propriamente construído. O desenho do bicho está à seguir.

A ideia nasceu de uma "equipa" de protótipos 2 litros, patrocinada pelo banco BIP. Entre outras coisas, Carlos Santos e Carlos Mendonça ganharam a a categoria 2 litros dos 1000 km de SPA de 1973 com um carro da BIP, na realidade, uma Lola T292 inscrita pelo team Bonnier. Os portugueses continuaram a fazer sucesso e pretendiam entrar na F1 com o patrocínio do banco. Só que daí veio a revolução de 1974, o banco foi nacionalizado, e o projeto BIP foi a ver caravelas.

O trio Bravo Marinho (sim, Bravo era o seu nome), engenheiro José Megre e João Pereira deu continuidade à ideia, e de fato, projetaram um carro que pretendiam usar já na temporada de 1975. Chegaram a falar em participar do GP da Espanha e da Bélgica de 1977, mas não apareceram os patrocinadores. Até que era um desenho arrojado, com motor Cosworth e cãmbio Hewland (lógico). Só não saiu do papel.

Quem seria o piloto do Marinho-F1, sabe-se lá...

Mas que os portugueses pensaram na coisa, lá é verdade.


 O F-1 lusitano

Estes projetos-fantasma tiveram diversas configurações diferentes. Há os completamente delirantes que provavelmente não passaram de boatos bem intencionados, em alguns casos, carros foram construídos, mas a falta de dinheiro impossibilitou a empreitada, outros sequer sairam do pape. Alguns não chegaram no papel, seriam o proverbial papo furado. Fabricantes como Abarth e Alpine também construiram carros experimentais de F-1, o caso da Alpine, um deles foi construído escondido da direção da Renault. A Cosworth também fez um F1 experimental, e supostamente, até a Audi estava construindo um F1 de 5 cilindros em 1985, anunciado com fanfarra no prestigioso jornal Motoring News. Outros fabricantes menos cotados, como os italianos Bizarrini e Serenissima, também sonharam alto.

Houve até os projetos com motivação política, de países comunistas que queriam provar ser tão prolíficos com tecnologia quando os capitalistas. Sobre estes já escrevi também. Veja aqui http://carlosdepaula.blogspot.com/2014/11/um-pouco-de-tudo-e-um-pouco-de-nada.html

Além dos russos, a tcheca Skoda também fez barulho, alegando ter construído um fórmula 1, que obviamente, nunca disputou corridas no Ocidente. Provavelmente, nada tinha de F-1.

Além dos comunistas, países emergentes também tentaram mostrar ao mundo que eram tecnologicamente superiores. Quando a Lamborghini foi vendida aos indonésios, em 1996, nada menos do que o filho do ditador Suharto (o ditador que não tinha sobrenome, algo comum com indonésios)  sonhou com um projeto de F1, o Humpuss-Lamborghini. Não foi adiante mas eventualmente um piloto do país conseguiu pilotar na F1.

Entre os insistentes, o campeão é o ex-projetista da Ferrari, o argentino Enrique Scalabroni. Enrique esteve envolvido em pelo menos três desses projetos fantasma, a equipe do japonês Tetsu Ikusawa, a Durango e a Asiatech. Entre as três, o projeto da Asiatech pareceu mais próximo de ser concretizado, entre outras coisas, negociou com Prost na fase final da equipe do le Professeur.  Em 1998, o sérvio Zoran Stefanovic  tentou rehabilitar as Lolas T97, formando a equipe Stefan. Deu em nada. A equipe voltou à carga em 2010, planejando absorver as operações da Toyota, que caira fora da F1. A FIA não aprovou o esquema.

O neozelandês Howden Ganley resolveu seguir o caminho dos conterrâneos McLaren, Mcrae, Amon e Nicholson, e tornar-se construtor após aposentar-se das pistas. O Ganley de F-1 foi construído pelo exímio mecânico, porém, não surgiu a grana para colocá-lo na pista no ambiente econômico terrível de 1975. Eventualmente Ganley fez sociedade com o também ex-piloto Tim Schenken, formando a Tiga, que também teve um projeto de F1 natimorto. A Tiga fez algum sucesso em outras categorias antes de ir para o cemitério de fabricantes de carros de corrida.

Outro insistente foi Dydo Monguzzi, que tentou lançar o Dywa de F1 em 1973, com motor Chevrolet e depois em 1979, com motor Cosworth.  Um carro chegou a participar da série Aurora, sem qualquer sucesso.

Diversas equipes que participaram F1 nasceram de bem sucedidas equipes de F2 e F3000, e alguns dos F1 fantasma tinham o mesmo pedrigrê. Entre os notáveis encontram-se FIRST, DAMS, Il Barone Rampante.  Os boatos de entrada de fabricantes de monopostos de fórmulas menores e protótipos foram frequentes, como GRD, Dome, TOMs, Reynard, Spice, Hawke,  Maurer. Outra moda foi resuscitar nomes antigos famosos como Vanwall, Bugatti, BRM, e mais recente, Brabham e March, na onda da renascida Lotus (ou renascidas Lotus...).

Muitos dos fantasmas apareceram durante o reino da dobradinha Cosworth-Hewland, porém, alguns delirantes antes e depois do famoso V8 tentaram entrar na categoria maior. O obscuro piloto americano Jocko Maggiacomo, por exemplo, tentou entrar na F1 com o Jocko-Climax em 1960, e até um fabricante holandês de carrocerias de ônibus, a Van Hool, sonhou com a F1 em 1975.

Alguns projetos bizarros, como um carro de oito rodas (até de doze) e um carro equipado com motor MG com super compressor (o Gleed-MG) também apareceram nas páginas das revistas, mas nunca nas pistas.

Antes do Campos, uma das quatro propostas escolhidas para entrar na F1 em 2010 que acabou se tornando o pesadelo Hispania, os espanhois sonharam com o Pegaso em 1954, que chegou a ser inscrito no GP espanhol daquele ano (não apareceu) e o Bravo em 1993. Já os mexicanos sonharam com o Glas-Lamborghini, que eventualmente trocou de cidadania e se tornou o Modena-Lambo, já em mãos italianas, e que teve o mérito de participar e marcar ponto na F1.

Curiosamente, um dos mais bem sucedidos chefes de equipe de F1 conheceu fracasso na sua primeira tentativa na fórmula maior. Ron Dennis era dono da Rondel, uma equipe bem sucedida de F2, que em 1973 construiu seu próprio carro, batizado Motul em homenagem ao patrocinador e ganhou corridas. Para 1974, Dennis pretendia entrar na F1. As coisas não foram bem, a economia ia mal, e Dennis voltou para a F2 e F3. O carro acabou se tornando o largo Token, que chegou a correr sem aerofólio dianteiro, algo raro na época. Em 1975 o carro se tornou Safir, que eventualmente desapareceu das pistas.

Hoje em dia especuladores e delirantes são mais difíceis de aparecer, entre outras coisas, por que os critérios de entrada na F1 mudaram.  Nos últimos anos, o grande fiasco foi a US F1, que quase afunda a carreira do excelente piloto argentino Jose Maria Lopez. Muitos dizem que não passava de um exercício de relações públicas, sem um objetivo claro. Foi um dos quatro escolhidos para entrar na F1, porém, nunca chegou próximo de entrar nas pistas.   

Há diversos outros carros (e motores) fantasma, mas fica para outro dia.

  

  

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