Gerações

Há quem jure de pé junto que os atributos de um bom piloto estão no DNA. Pode ser que uma ou outra coisa passe na genética, porém, muita coisa deve ser ambiental mesmo, e mais ainda, fruto da personalidade individual de cada um, sem contar que as portas se abrem com mais facilidade para filhos de ex-pilotos. Na realidade, há muitos filhos de ex mega campeões mundiais como Niki Lauda que não deram em nada, embora Nico Rosberg prometa. E uma fila imensa de outros filhos de pilotos com pedrigrês mais fracos ainda.

A possível estrela deste campeonato é justamente um filho de ex-piloto de F1 do qual muito se esperava, e pouco ocorreu, Kevin Magnussen. Portanto, o tema é interessante.

Mais interessante ainda é a situação da família belga Pilette, que teve pilotos em três gerações diferentes, Theodore no começo do século XX, André, cujas principais atuações se deram nas décadas de 50 e 60, e por fim, Teddy, que correu entre as décadas de 60 e 80.

O caso dos belgas é curioso, em grande parte porque a Bélgica só teve um grande campeão a nível mundial, Jacky Ickx, que quase foi campeão de F1, ganhando diversos GPs e corridas, além de ser campeão na F2, Can-Am, Carros Esporte, e ter ganho corridas em diversas outras categorias, durante 2 décadas, sendo durante muitos anos o recordista de vitórias em Le Mans. Desde que Ickx se foi da F-1, somente Thierry Boutsen conseguiu permanecer na categoria durante uns bons anos, e ganhar GPs. Para os belgas a jornada tem sido difícil na categoria máxima do automobilismo, porém, pilotos da simpática nação vez por outra ganham corridas nas categorias inferiores.

De fato, um dos primeiros pilotos famosos, cujas realizações faziam notícia, foi o belga Camille Jenatzy, o primeiro homem a superar os 100 km por hora com seu "Jamais Content". A Bélgica, afinal de contas, fica ao lado da nação onde foi criado o automobilismo de competição, e no começo do século XX houve algumas fábricas belgas de automóveis, que não sobreviveram no mercado.

No caso da família Pilette nota-se algo curioso em relação às três gerações, nas corridas de GP. O patriarca Theodore chegou a ser piloto da Mercedes, nas corridas de GP (Fórmula 1 ainda não existia) e até nas 500 Milhas de Indianapolis, uma posição que certamente equivaleria a ser piloto de fábrica da mesma Mercedes atual. Já o filho André, nunca conseguiu pilotar para uma equipe de fábrica de primeira. Foi piloto da fraca Gordini, pilotou Talbots, Connaught, ENB e Scirocco, e chegou a marcar pontos no Mundial de Pilotos, porém, sua carreira foi pontuada por carros fracos, sem contar alguns acidentes assustadores. O neto Teddy quase entra na F1 no comecinho da sua carreira, na equipe de Reg Parnell, que era amigo do seu pai. Entretanto Reginald morreu, e Teddy teve que esperar mais de uma década ´para ter sua primeira oportunidade, e foi numa equipe boa. Porém, no lugar certo na hora errada.

Foi no GP da Bélgica de 1974, na Brabham, equipe que demonstrava muita velocidade naquele ano. Foi na hora errada por que em Nivelles, apesar de um número razoável de Brabhams na pista, nada deu certo para os carros da marca inglesa naquele dia. Sequer o bem cotado Carlos Reutemann, que liderou todas as primeiras corridas do ano, foi bem. De fato, foi a pior performance de Reutemann com a Brabham naquele ano. Não é preciso dizer que Ecclestone não chamou o belga de volta, embora ainda estivesse à procura de um número 2 para a equipe, que acabou sendo José Carlos Pace.  Em 1977. Pilette voltou à F1, no pior lugar possível. Tentou largar em alguns GPs com a BRM, marca anteriormente gloriosa, e que tinha no P207 uma saída vergonhosa da categoria.

Entretanto, nota-se algo mais curioso ainda. Theodore, que teve as melhores chances nos GPs, teve poucos resultados maravilhosos na sua carreira (na época corria-se pouco, cabe lembrar). André marcou pontos na F1 e carreira mais longa nos GPs, porém, suas vitórias em outras categorias foram poucas. Já Teddy, que teve poucas oportunidades, obteve diversas vitórias na sua carreira, sendo duas vezes campeão do Europeu de Fórmula 5000, vencedor das 24 Horas de SPA (carros turismo), dos 500 km de Nurburgring e Vila Real (carros esporte), e de corridas de Fórmula Junior.

Não há, aparentemente, nenhum nexo causal nisso. É meramente uma observação que neste caso, o sucesso no mundo dos GPs foi inversamente proporcional ao sucesso em outras categorias. Somente uma curiosidade, nada mais.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiado de automobilismo baseado em Miami
 

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