O jabá, ora o jabá

Algumas pessoas podem não saber o que é o jabá. Jabá é a grana exigida por uma emissora de rádio de músicos, tocar suas músicas e torná-las sucesso. Em muitos lugares do mundo, o jabá é proibido, resultando em escândalos, processos, até prisões. Supostamente, o programador de uma rádio deve escolher imparcialmente as músicas que serão tocadas.
Pode ser que eu me arrependa de escrever este post. Não será a última, sequer a última vez que me arrependo de nada. Entretanto, vou me abster de dar nome a bois e vacas, e assim, evito ofender qualquer pessoa, veículo ou entidade.
Basta abrir os jornais, principalmente jornais online, para ver que até hoje, muitas notícias são plantadas. De fato, certas manchetes às vezes aparecem sete dias seguidos na página inicial de alguns jornais online. Obviamente, os artigos não são repetidos por que são interessantes, até por que não são, porém, existe uma razão para estarem ali. Puro merchandising, anúncios travestidos de artigos, de pauta.
As rodas do comércio não podem ser paradas.
Lembro-me que há umas décadas atrás, sempre que alguém escrevia uma carta a uma certa revista brasileira perguntando porque não publicavam artigos sobre assunto x ou y, a resposta, curta e grossa, era que não havia "interesse jornalístico". Obviamente, revistas e jornais têm caro espaço limitado, e frequentemente, é necessário tomar uma decisão sobre o que deve ou não ser editado. Já na internet o argumento fica a dever, pois o custo de bytes infinitamente inferior ao de papel, tinta e distribuição de mídia impressa.
Passemos um pouco adiante. Outro dia estava discutindo com um amigo sobre a falta de cobertura da Stockcar brasileira até em revistas especializadas em automobilismo na década de 90. Ele inclusive notou que, apesar da falta das reportagens sobre a categoria num certo veículo, este continha incontáveis páginas sobre corridas de kart.
Até dava para entender que uma revista que não somente cobria automobilismo de competição, como também turismo, mercado automobilístico, náutica, etc, tivesse que pensar duas vezes antes de publicar reportagens longas sobre corridas de segunda. Entretanto, o que levaria um veículo supostamente especializado em corridas, a se furtar de publicar sequer os resultados de uma categoria que sempre foi uma das principais, senão a principal do automobilismo de competição, e em seu lugar, publicava faustas reportagens sobre kart?
Pela lógica, uma publicação especializada no automobilismo deveria publicar artigos e resultados de automobilismo seguindo uma ordem hierárquica. Já imaginaram uma revista de futebol que só publica reportagens sobre a série C do campeonato brasileiro, e deixa a A do lado?
Pois historicamente, ocorreu em certos setores da imprensa especializada brasileira um hábito nefasto. REPITO, NÃO É TODO MUNDO QUE FAZ OU FEZ, NÃO ESTOU GENERALIZANDO. Alguns, de dia, eram repórteres e jornalistas, e fora do expediente, viravam assessores de imprensa de pilotos. Daí que, a sua cobertura muitas vezes se esmerava em categorias menores - de onde vinha o polpudo jabá - deixando de lado as categorias superiores, que se recusava a perpetuar a prática.
O sistema na realidade não tem ajudado muito o automobilismo, aliás, não ajuda em ABSOLUTAMENTE NADA. As famílias de jovens pilotos, mesmo de kart, no passado, foram instruídas a contratar assessores, alguns dos quais, eram também repórteres, dentro do esquema acima. Isso ajudaria a garantir a divulgação dos feitos do pimpolho, azeitados com um jabazim...Só que, num sistema viciado, quem não ganhava dindin não queria publicar nada, e a promoção era reduzida.
Alguns pilotos brasileiros que tiveram uma excelente carreira no exterior reclamam justamente disso. No Brasil, seus feitos são desconhecidos, por que nunca pagaram jabá. E alguns jovens, depois de alguns anos pagando o jabá travestido de assessoria, desistiam da carreira, pois a exposição midiática foi insuficiente para gerar interesse de patrocinadores.
Repito, não estou dizendo que toda assessoria de imprensa de pilotos é assim. NÃO É. Tem muita gente que faz um trabalho honesto, sem jabazizar ninguém. Porém, isto pode explicar por que hoje muitos não publicam os nomes de patrocinadores nos resultados de corridas. Antigamente, ninguém escrevia Equipe Z, e sim, Equipe Hollywood. Por exemplo, hoje em dia, ocorre o contrário, muitos escrevem equipe AMathheis, em vez de indicar quem paga as contas da equipe. A não ser que...
Tenho entre meus amigos, dezenas de jornalistas, repórteres, blogueiros, assessores de imprensa. Que me conste, nenhum de vocês foi identificado como jabazeiro. Portanto, você não é o assunto deste post e não estou mandando recadinho para ninguém.
Entretanto, para os jabazeiros de plantão, antes de ficar dizendo que o automobilismo brasileiro está em crise quase terminal, lembre-se que você é uma grande parte do problema.

Se alguém comentar este post, peço a gentileza de não identificar nenhuma pessoa física ou jurídica. Meu intuito não é criar celeuma, mas sim, identificar um problema.
Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo, e nem sabe qual é a cor de um jabá.

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