Magnussen e a mudança de paradigma

Já venho dizendo há um bom tempo que ocorreu uma mudança de paradigma de ascenção dos pilotos à F-1. O modo tradicional já era, e a recente contratação de Kevin Magnussen é simplesmente uma afirmação do que tenho dito. Serve o aviso para os pais de pilotos brasileiros que desejam revelar o próximo "Ayrton" - as coisas não se fazem mais como no passado.

Antes de tecer comentários sobre a contratação de Magnussen, é importante refletir sobre a curta carreira de Sergio Perez na McLaren. No ano passado, o mexicano era o queridinho do paddock, de fato, muitos (inclusive eu) achavam que terminaria na Ferrari em 2013. Foi competitivo, rápido, e demonstrou bastante maturidade considerando a sua pouca experiência. No fim das contas, Perez acabou na McLaren, que poderia ter sido o início de uma cerreira brilhante, mas pelo jeito, é o final da sua passagem por equipes top.

Só um louco diria que a temporada de Perez foi boa. Entretanto, o maior culpado disso não foi o próprio piloto, mas sim a McLaren que produziu seu pior carro desde 1980. Somente um milagre faria a McLaren ganhar algo neste ano, e de fato, não pode almejar sequer pódiums. O Lewis Hamilton, que parecia louco ao trocar de equipe no ano passado, acabou gênio. A pressão ficou toda em cima do mexicano. Button já está há anos na equipe, já foi campeão mundial e ganhou muitas corridas, não tinha nada a provar. Perez fez quilos de erros, pareceu nervoso, e o resultado está aí.

Ocorre que o histórico da McLaren com pilotos latinos - de perfil latino - não é bom. Sim, Ayrton Senna, Emerson Fittipaldi e Alain Prost são latinos, porém, seu comportamento é mais anglo-saxão do que latino. Os últimos dois latinos antes do mexicano, Juan Pablo Montoya e Fernando Alonso, saíram da equipe após curta passagem, sem atingir os almejados patamares e brigados. Imagino que o regime rigoroso da McLaren não se adapta ao modo latino de ser  (porém, caía como uma luva em Senna e Prost). Esse esquema cria pressão nos latinos, que acabam metendo os pés pelas mãos na sua passagem por Woking.

O modo McLaren de ser é antigo, vem desde a época de Bruce. Foi adaptado por Teddy Mayer, e polido por Ron Dennis. Martin Whitmarsh não mudou as coisas.

Não surpreende, pois, que a McLaren tenha um certo xodó por pilotos finlandeses, já teve quatro.

A pergunta que resta é a seguinte. Será que a contratação de Perez não foi defensiva, ou seja, impedir que a Ferrari ficasse com o piloto, e que não havia real intenção de mantê-lo (salvo se o cara saísse ganhando tudo, lógico). Pois, sem dúvida, quando anunciada, a contratação supreendeu a muitos.

Voltemos ao tal paradigma. Equipes como Red Bull, Ferrari, McLaren e Mercedes investem nas carreiras de pilotos desde uma tenra idade. De fato, Lewis Hamilton já era piloto McLaren quando era guri, e para nunca ser promovido à equipe de F1 tinha que fazer muita besteira. O tal investimento não é só tapinhas nas costas. Trata-se de um investimento financeiro de longo prazo. E como todo investidor, chega o dia de recuperar o investimento. A Ferrari, por exemplo, não investiu na carreira de Jules Bianchi para que ele seja eternamente um piloto da Marussia - mais cedo, mais tarde, o francês correrá na Scuderia.

Após a contratação de Ricciardo pela Red Bull, em detrimento de Kimi Raikkonen, ficou claro que a equipe se cansou de esperar por um piloto equivalente a Vettel, formado na Toro Rosso. Cabe lembrar que Vettel fez uma senhora temporada na humilde equipe, ex-Minardi, em 2008, e de fato, ganhou uma corrida nela antes que a Red Bull ganhasse um GP. Os pilotos da Toro Rosso desde então têm sido somente razoáveis.

A temporada que vem é ideal para contratar novatos, embora diga-se o contrário, que a experiência valerá muito. Por que se o Ricciardo não der certo, ou se o Magnussen não der certo, existe a desculpa de que foi um ano de transição, blá, blá, blá.

Conclui-se então que as grandes equipes da atualidade operam com cartas marcadas. Estas são os pilotos das suas "academias". Sim, ficam atentos, esperando aparecer um novo Vettel em outras paragens, porém, sabem que a estrutura que possibiltam aos seus guris é difícil de superar.

O paradigma simplesmente mudou, e o fato de o ainda jovem Perez, que subiu na carreira de modo tradicional, ter sido tão rapidamente preterido por Magnussen, cuja ascenção segue o novo paradigma, mostra que os tempos mudaram. E que a coisa ficou muito mais difícil para pilotos não europeus.
   
Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo baseado em Miami

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O taxista de São Paulo, e muito disse não disse

RESULTADOS DE CORRIDAS BRASILEIRAS REMOVIDOS DO BLOG

DO CÉU AO INFERNO EM DUAS SEMANAS - A STOCK-CAR EM 1979