Campeões farsantes

Persiste em alguns meios brasileiros a ideia de campeões de F1 farsantes. Inicialmente atribuída a Nigel Mansell, posteriormente receberam o "título" Michael Schumacher e agora, Sebastian Vettel. Como brasileiro tem o mítico medo de criticar morto e doente (porém, não poupa crítica aos vivos), deixaram o Schumacher de lado por agora, e o Vettel é o maior objeto de escárnio.

Não sou psicólogo, porém, cabe lembrar que existe uma coisa chamada psicologia da motivação; Observa-se na história que toda hegemonia um dia cai. Isto ocorre com impérios, países, economias, equipes, empresas e seres humanos. Perguntem aos psicólogos se desejam detalhes, pois não sei explicar. Grosso modo, em minhas parcas palavras de leigo, depois de tanto ganhar e sobrepujar seus concorrentes, estabelece-se uma complacência, às vezes temporária, às vezes permanente. São os ciclos da história. Ou seja, ganhar também cansa, e requer muita motivação.

Comecemos com Nigel Mansell. Dizer que em 1992 qualquer piloto ganharia o campeonato com aquela Williams é um desrespeito. Nunca gostei da pessoa de Mansell, que fique claro, e não torcia para ele. Porém, cabe lembrar que seu companheiro de equipe Patrese não era um piloto fraco, e ganhou muito menos do que o inglês naquele ano. Nigel, por outro lado, simplesmente acabou com Piquet durante as duas temporadas em que estiveram juntos na Williams. E le Professeur Prost ganhou o campeonato de 93 com muito mais dificuldade do que o inglês, ao passo que no início de 94, Senna sofria com a mesma Williams-Renault, em comparação com Schumacher. Que o carro era superior, não há dúvida.

Entendo toda a raiva dos brasileiros contra Schumacher. Afinal de contas, durante o auge da sua hegemonia Schumacher teve o brasileiro Barrichello como companheiro de equipe, e o resultado comparativo das carreiras dos dois na Ferrari foi bem parecido com o 7 x 1 do Mineirão. Daí a dizer que o Schumacher foi um mal piloto parece coisa de gente mal resolvida com a vida, para não dizer coisa pior. Ninguém ganha 93 GPs sendo uma farsa durante quase duas décadas!

Que nos leva a Vettel. Não há dúvida de que a temporada de Seb foi relativamente fraca. Seu companheiro Ricciardo foi bem melhor em quase todas as corridas (com certa medida de sorte que faltou a Seb em doses cavalares, em diversas), e, a meu ver, a ideia de sair da Red Bull não ocorreu no final da temporada, já vinha de longe. Vettel simplesmente me pareceu desmotivado na equipe austríaca nesse ano, principalmente considerando a velocidade da Mercedes equipe e Mercedes motor. Daí a dizer que seus quatro campeonatos seguidos foram uma farsa, me parece  coisa de gente mal resolvida com a vida, para não dizer coisa pior. 

O fato de um piloto ser hegemônico numa categoria não deve ser usado contra ele, mesmo que seja equipado com um carro obviamente melhor que o dos concorrentes. Vejamos exemplos no nosso Brasil. Camilo Christofaro preparava os melhores carros da última fase das categorias Carretera e Mecânica Continental no Brasil. A diferença de preparo era visível, sendo assim, parecia que Camilo corria numa categoria diferente. Culpa dele? Diria que não. Por causa disso era uma farsa como piloto? Obviamente que não. Aqueles carros não eram fáceis de pilotar rapidamente  e Camilo não tinha culpa de ser um primoroso mecânico e preparador.

O mesmo pode-se dizer de Luis Pereira Bueno e o Berta-Hollywood  em 1975. Sim, o carro praticamente estava numa categoria separada. Há quem diga que nem deveria estar na D4, porém, novamente milita o fato de um D4 da categoria B não ser um carro fácil de pilotar, mesmo que não seja no limite. E Luisinho provara que tinha braço bem antes do Berta e do 908, pois ganhara muitas corridas com o protótipo Bino e outros carros mais fracos contra carros mais potentes.

Por isso, me furto de comentar sobre esse assunto no Facebook ou seja onde for.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo baseado em Miami

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