A temporada de F1 de 1974 e algumas considerações

Para a maioria dos brasileiros, o grande charme da temporada de F1, ocorrida há 40 anos atrás, foi o segundo título de Emerson Fittipaldi, o primeiro obtido pela McLaren. Entretanto, há muita coisa interessante que ocorreu nesta temporada, distinguindo-a das outras.

Primeiro, o grande número de participantes, tanto pilotos como equipes. Um número recorde de pilotos participou desta temporada. Por diversas razões, uma delas econômica, muita gente convergiu para a F1 que começava a despontar como fenômeno televisivo. Isto numa época de recessão econômica na Europa, que causou o início de declínio de diversos campeonatos e categorias, como o Mundial de Marcas, Europeu de Turismo, Fórmula 5000, Intersérie, Can Am, Europeu de 2 Litros. Sem alternativas, muitas equipes e pilotos arranjaram uma maneira de disputar a F1, aos trancos e barrancos, afinal ainda era muito mais fácil obter patrocínio nesta categoria do que em outras. Assim, o ano de 1974 foi o último ano com grande número de privateers, que disputaram provas com uma grande variedade de marcas - March, Brabham, Tyrrell, Mclaren, Surtees e Lotus. Porém, foi justamente a situação econômica difícil de algumas equipes, notavelmente a Surtees e Brabham, que disponibilizou lugares para pilotos com bons patrocínios pessoais.

Foi nesta temporada que os grids passaram a ter exclusivamente o formato 2-2, pois até 1973 se disputavam algumas corridas com o 3-2-3. Este é um detalhe importante no quesito segurança. Porém, dois pilotos morreram durante a temporada, Peter Revson, em Kyalami, e Helmut Koinnig, em Watkins Glen, duas pistas que foram palco de outras mortes de pilotos de F1, no futuro, no caso da primeira, no passado, da segunda.

A grande maioria dos pilotos era europeia, embora tenham participado pilotos da América do Sul, América do Norte, África e Oceania.

América do Sul
Brasil (E. Fittipaldi e J.C.Pace)
Argentina (C. Reutemann)

América do Norte
EUA (P. Revson, M.Donohue, M. Andretti)
Canadá (E. Wietzes)

África
África do Sul (J. Scheckter, I. Scheckter, P. Driver, D. Charlton, E. Keizan)

Oceania
Austrália (T. Schenken, L. Perkins, V. Schuppan)
Nova Zelândia (D. Hulme, C. Amon, H. Ganley, J. Nicholson) No caso deste país, foi a última temporada em que participaram Hulme e Ganley.

Entre os países europeus, a Finlândia, que um dia se tornaria uma potência na categoria, estreou.

Europa
Finlândia (L. Kinnunen) Foi o último piloto a usar capacete aberto
Dinamarca (T. Belso)
Suécia (R. Peterson, R. Wissel, B. Roos)
Itália (A. Merzario, V. Brambilla, C. Facetti, L.Lombardi)
Lichtenstein (R. von Opel)
Alemanha (J. Mass, H.J. Stuck, R. Stommelen)
Holanda (G. Van Lennep)
Suíça (C. Regazzoni)
Bélgica (J. Ickx, T. Pilette)
Áustria (N. Lauda, D. Quester, H. Koinnig)
França (J.P. Beltoise, J.P. Jabouille, J.P. Jarier, J. Laffite, F. Migault, J. Dolhem, H. Pescarolo, G. Larrousse, P. Depailer)
Grã-Bretanha (J.Hunt, D. Bell, D.Hobbs, B. Redman, J. Watson, R. Robarts, G. Hill, G. Edwards, M. Wilds, T. Pryce, M. Hailwood, P. Gethin, D. Purley, I. Ashley). Muitos desses britânicos foram pilotos importantes na F1 ou em outras categorias, e disputaram nesse ano suas últimas provas - Hill, Hailwood, Redman, Bell, Gethin e Hobbs.

Cabe notar que um número razoável destes pilotos não conseguiu largar num único GP, a maioria de equipes fracas, ou de equipes privadas, os "privateers". Entre esses encontram-se Perkins, Facetti, Purley e Nicholson.

Em 1974 ainda era comum equipes alinharem 3 carros, como foi o caso da BRM em grande parte da temporada, da Brabham em algumas corridas e da McLaren, por força de uma briga contratual com o patrocinador Yardley.

Interessante notar também o grande número de marcas que estreou naquela temporada. Nada menos do que oito. Amon, Maki, Lyncar, Token, Trojan, Hesketh, Penske e Parnelli. Nenhuma sobreviveu muito tempo na categoria, porém, Hesketh e Penske eventualmente ganharam provas.

Junta-se a estas oito estreantes outros participantes - Lotus, Iso Marlboro, Ferrari, Brabham, BRM, McLaren, Shadow, Surtees, Tyrrell, Ensign e a Lola que voltava depois de alguns anos longe da categoria, fornecendo chassis para a equipe de Graham Hill.
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Nada menos do que quatro pilotos tinham chances de ganhar o campeonato na fase final, nosso Emerson, e também a dupla da Ferrari, Lauda e Regazzoni, e Jody Scheckter. Nenhum piloto dominou o campeonato, e três ganharam 3 corridas, Emerson, Reutemann e Peterson.

Scheckter foi o primeiro africano a ganhar um GP (e continua a ser o único até hoje), trazendo boa diversidade ao mundo dos GPs. Cabe notar o grande número de privateers no GP da África do Sul, pois além de Jody correram seu irmão Ian, David Charlton, Paddy Driver e Eddie Keizan.  A África do Sul era uma país interessante - não tinha TV, porém  tinha seu próprio campeonato de F1, daí tantos carros "locais". Em 76 chegaria a TV e acabaria a F1 local...

Em suma, todos esses fatores fizeram desta temporada de F1, e nos ensinam algumas lições, em termos da expansão de grids na F1. Primeiro, se as equipes privadas já tinham pouca chance em 1974 (a única razoável era a Hexagon), quando a maioria dos carros eram kit cars Cosworth-Hewland, que dizer de hoje em dia, quando o equipamento usado pelas equipes de F1 pode levar um homem à lua. Obviamente, equipes privadas não podem ser a resposta.

Equipes fracas já existem na F1 atual, e de fato, duas delas dão sinais de que não estarão no grid em 2015. A nova equipe americana (hesito em dizer o nome, pois provavelmente terá outro, se alinhar um carro algum dia) também deverá ser fraca, e permanecerá fraca até desaparecer.

Equipes com 3 carros...a insistência em alinhar equipes grandes levou a BRM à falência final em 1974, e no ano seguinte apareceria uma nova, mais fraca Stanley-BRM. Nas outras instâncias em que equipes alinharam 3 carros, com a exceção da Brabham na Áustria, o resultado não foi muito bom.

Acho que é melhor nos acostumarmos com grids com menos de 20 carros.

Carlos de Paula é tradutor, escritor e historiador de automobilismo

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